Policiais presos por morte de pai e filho faziam segurança de cerâmica assaltada meses antes do crime
15/05/2024
(Foto: Reprodução) Uma das linhas de investigação é de que os agentes foram contratados para executar os assaltantes do estabelecimento, mas mataram as vítimas por engano. Homem e adolescente são assassinados com vários tiros no Eusébio, na Grande Fortaleza
TV Verdes Mares/Reprodução
Os dois policiais militares presos pelo assassinato de pai e filho que estavam a caminho da escola no Eusébio,trabalhavam como seguranças em uma cerâmica da cidade de Itaitinga, que havia sido assaltada três dias antes do crime na Região Metropolitana de Fortaleza.
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Uma das linhas de investigação da polícia é de que Francisco Adriano da Silva, de 42 anos, e o filho Francisco Gabriel da Silva, de 13 anos, foram executados por engano pelos agentes contratados para matar um jovem que havia participado do assalto a empresa em junho de 2023.
Pai e filho foram mortos por engano por policiais contratados para matar assaltantes, aponta denúncia
Arquivo pessoal
De acordo com o processo que corre em segredo de Justiça e que o g1 teve acesso, no dia 15 de junho do ano passado três homens armados invadiram a cerâmica localizada em Itaitinga e subtraíram R$ 1.338 referente ao pagamento de um funcionário e cerca de R$ 5 mil do caixa da empresa.
Alguns dias depois, o grupo formado pelos agentes Paulo Roberto Rodrigues de Mendonça, Halley Handroskowy Magalhães Martins e Anderson Rafael Mouta da Silva passaram a fazer levantamentos e pesquisas sobre indivíduos que residiam nas proximidades da cerâmica.
Entre os pesquisados pelos militares, estava um jovem com mandado de prisão em aberto e antecedentes criminais por homicídio, que morava próximo ao endereço das vítimas assassinadas.
Pai e filho foram mortos por engano no Eusébio
Conforme o inquérito policial, Paulo Roberto, apontado como o autor dos disparos, e Halley Handroskowy, que estaria pilotando uma motocicleta e auxiliou a ação, confundiram o adolescente Francisco Gabriel com o suspeito que procuravam. O jovem teve 14 perfurações causadas por entradas e saídas dos projéteis. Já o pai dele tinha apenas duas.
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Ligação com assalto a cerâmica
Além do fato dos investigados trabalharem na segurança da cerâmica assaltada. Em um dos aparelhos celulares apreendidos durante a investigação, foram encontradas várias imagens de consulta aos dados criminais do assaltante no sistema da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS). Estas pesquisas aconteceram enquanto os policiais estavam no estabelecimento.
Além disso, um relatório técnico demonstrou que após o crime Paulo Roberto e Halley usaram um carro para ir até a sede da cerâmica, onde permaneceram por um período. Horas depois, Paulo foi preso portando o valor de R$ 4 mil em espécie.
"O longo período de tempo em que teriam permanecido na cerâmica [...] logo após o crime, aliado ao fato de que, no momento da abordagem, Paulo Roberto tinha consigo o valor de R$ 4 mil em cédulas de cem reais, levanta a hipótese de que estavam lá para um acerto de contas e para o recebimento da vantagem indevida, eventualmente, ajustada pelo cometimento do crime", diz um trecho do documento.
Em depoimento, Halley negou que trabalhasse na segurança da cerâmica, porém durante busca e apreensão na casa dele os agentes apreenderam uma via impressa do Documento de Arrecadação Estadual (DAE) do veículo visto entrando no estabelecimento após o duplo homicídio e um boné com a logomarca da empresa.
Ao depor, o policial Anderson Rafael, também investigado pelo caso, colocou em contradição a negação de Halley de que não trabalhou para a empresa, pois relatou que o conheceu no local, assim como Paulo Roberto.
Ainda durante o relato, Anderson informou que os militares eram indicados por pessoas de confiança, mas a escolha era feita pelo dono do estabelecimento.
Mandado contra empresário
Em fevereiro deste ano a Polícia Civil cumpriu um mandado de busca e apreensão e apreendeu o aparelho celular do empresário, que também é pai de um prefeito.
"Vale dizer, somente o responsável pela Cerâmica [...], o empresário [...], se ajusta ao perfil definido para o autor mediato, segundo os critérios do interesse e da capacidade econômica", afirma o documento.
Na ocasião, o proprietário da cerâmica foi abordado por policiais rodoviários federais ao passar no Posto da Polícia Rodoviária Federal (PRF), em Itaitinga. No momento do ocorrido, ele estava acompanhado da filha e do motorista.
"No entanto, não se vislumbra ainda elementos de convicção suficientes para decretar a medida contra as pessoas de [...] e a Cerâmica [...], sem que se saiba se os demais investigados realmente receberam valores oriundos daqueles, razão pela qual o indeferimento, ao menos momentâneo, da representação contra o empresário e a empresa é a medida que se apresenta prudente", disse a polícia no inquérito.
Prisões
Investigação da Polícia Civil levou à identificação de PM envolvido em morte de pai e filho no Eusébio.
Arquivo pessoal
O primeiro suspeito identificado foi o policial Paulo Roberto, de 38 anos. Equipes da Delegacia de Assuntos Internos (DAI) e do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) montaram operação de vigilância em frente à residência dele, que tentou fugir de carro quando percebeu que seria abordado.
Durante a perseguição, o suspeito teria jogado objetos pela janela do veículo para tentar se desfazer de evidências, como a pistola que posteriormente foi confirmada como a arma usada para atirar contra as vítimas.
Paulo Roberto foi preso em flagrante no mesmo dia, em Fortaleza. Com o soldado, foram encontradas quatro armas, um simulacro, um silenciador, além das roupas usadas no momento do crime.
Em outubro de 2023, o Ministério Público do Ceará denunciou Paulo Roberto pelos seguintes crimes:
duplo homicídio qualificado - com as qualificadoras de crueldade;
impossibilidade de defesa da vítima;
emprego de arma de fogo de uso restrito e contra menor de 14 anos, pela morte do adolescente;
e impossibilidade de defesa da vítima e emprego de arma de fogo de uso restrito, pelo assassinato do pai.
O policial militar já era réu na Justiça por suspeita de balear uma criança, à época com 2 anos, durante uma ocorrência em Fortaleza. Paulo Roberto já era investigado desde 2017, por suposta prática de lesão corporal grave na modalidade culposa.
Com o avanço das investigações, Halley teve um mandado de prisão cumprido no dia 28 de fevereiro deste ano, sendo o segundo policial preso pelo crime. Na ocasião, um homem que não é agente de segurança e que não teve a identidade divulgada também foi preso.
A ação fez parte de uma operação da Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública para cumprir mandados de busca e apreensão e quatro de prisão em desfavor de dois policiais militares e dois indivíduos não policiais.
A defesa de Halley entrou com pedido de habeas corpus no Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), solicitando a revogação da prisão preventiva e o uso de outras medidas cautelares, que poderiam ser fiscalizadas com o monitoramento eletrônico. Ainda não houve decisão sobre o pedido.
Halley Handroskowy também já foi preso, em 2019, ao ser investigado pelo homicídio de um jovem de 21 anos em Fortaleza, juntamente com outros três policiais.
Conforme os autos, a vítima era Alisson Xavier Lima, assassinado no bairro Jangurussu. O jovem havia sido solto meses antes de ser morto, depois de ser condenado a quase cinco anos de prisão pelo crime de tráfico de drogas e recorrer para cumprir a sentença em liberdade.
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